A taxa média de desocupação da Bahia ficou em 19,8%, em 2020 – a maior do país para o ano, aponta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC) Trimestral, divulgada nesta quarta-feira (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados demonstram ainda que o índice é o mais alto para o estado desde 2012, quando começou a PNAD Contínua. Na Bahia, 8 em cada 10 pessoas que deixaram de trabalhar, de 2019 para 2020, eram informais. Na comparação dos dois anos, o grupo das atividades de comércio e reparação de veículos automotores e motocicletas foi o que mais perdeu trabalhadores em números absolutos no estado, com menos 170 mil pessoas ocupadas no setor.
Os resultados são reflexo da pandemia do novo coronavírus, segundo a supervisora de disseminação de informações do IBGE, Mariana Viveiros. Ela ressalta que 20 dos 27 estados bateram, em 2020, os recordes históricos da taxa de desocupação. Apesar das dificuldades serem generalizadas, Viveiros afirma que a Bahia foi mais penalizada.
A taxa baiana em 2020 ainda foi superior à do Brasil como um todo, que atingiu 13,5% de desocupados. O índice mede a proporção de pessoas a partir de 14 anos que não trabalharam e procuraram trabalho, em relação ao total de pessoas que estão na força de trabalho.
Ainda em 2020, o número de pessoas trabalhando, em ocupações formais ou informais, chegou ao mais baixo patamar desde 2012: 5.159 milhões. Isso representou menos 626 mil pessoas ocupadas, em média, de 2019 para 2020, na Bahia – uma queda de 10,8% entre os anos.
Já o número de pessoas sem trabalho, mas que procuravam emprego fez com que a população de desocupados no estado atingisse 1.272 milhão, em média, em 2020 – o pior resultado em 8 anos. Foi registrada a adição de 70 mil baianos à população desocupada ante 2019, um aumento de 5,8%.
O coordenador de Pesquisas Sociais da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), Guillermo Etkin, ressalta que a atividade econômica no Brasil e na Bahia já estava em marcha lenta antes mesmo da pandemia eclodir. Sendo assim, ele explica que o coronavírus não desencadeou uma crise no país, mas tornou mais aguda uma cena já fragilizada por desequilíbrios e marcada por um processo de recuperação lento.
“Não será a solução dessa questão sanitária o fator chave para catapultar o desempenho econômico. Diante desse contexto, é importante destacar que, no momento, não há outra compreensão senão a de que o ritmo de qualquer recuperação se encontra incerto”, alerta o especialista.
O recorde negativo da taxa de desocupação da Bahia, afeta as condições de vida da população, aponta Etkin. Dentre as consequências do quadro de instabilidade social diante da elevada incerteza sobre o futuro próximo está o aumento da insegurança e da sensação de insegurança.
“[Nesse cenário] Ocorre rápido e acentuado empobrecimento da população pertencente aos estratos inferiores de renda na sociedade. Especialmente os trabalhadores informais. Toda vez que o mercado de trabalho apresenta indicadores fragilizados também vem acompanhado da deterioração dos indicadores socioeconômicos, com graves impactos em indicadores que mensuram desigualdade. Com isso, vê-se mais crianças nos sinais e pessoas pedindo esmola”, explica
Para o especialista, a soma da depressão da massa de rendimentos dos trabalhadores, a redução do nível de ocupação a patamares mínimos históricos, o desemprego e o desalento elevados podem ser especialmente graves para os mais jovens.
Em 2020, Emilly Anunciação, 20 anos, passou de funcionária da barraca da prima para desocupada. Desde agosto, ela procura emprego para ajudar no orçamento da família, que ficou mais apertado com a pandemia. Entretanto, a jovem encontra dificuldades para voltar ao mercado de trabalho.
“Eu tinha um bico, mas minha prima mudou a barraca para um lugar menor e me dispensou em janeiro. Fiquei seis meses em casa. Voltei a procurar emprego em agosto, mas a pandemia fez ficar ainda mais difícil encontrar uma vaga”, comenta Emilly.
Fora da força de trabalho
Por cerca de 6 meses, Emilly ficou fora da força de trabalho por não estar trabalhando, mas também não procurar emprego. Esse grupo também aumentou na Bahia em 2020, segundo a pesquisa do IBGE.
Aqueles que estavam fora da força de trabalho atingiram, em média, 5.795 milhões de pessoas no estado, no ano passado – 782 mil a mais do que em 2019 (+15,6%). De acordo com o IBGE, essa é a primeira vez que o número de pessoas nessa condição superou o total de trabalhadores na Bahia. Além disso, esse é o maior contingente de população fora da força desde 2012.
Em 2020, o número de desalentados na Bahia voltou a aumentar após uma queda de 2018 para 2019. No ano passado, esse grupo somou 808 mil pessoas no estado, um acréscimo de 4,6% frente aos 772 mil registrados em 2019. O resultado do último ano é o maior em oito anos.
A pesquisa aponta ainda que a Bahia tem o maior número absoluto de desalentados do país em todos os anos da série da PNAD Contínua. Nesse intervalo, essa população cresceu em 150,5%, passando de 323 mil para 808 mil.
Na análise do coordenador de Pesquisas Sociais da SEI, o desalento histórico do mercado de trabalho indica saturação do processo de inserção e reinserção nos postos formais e informais.
“A pandemia contribuiu fortemente na alta deste indicador, na medida em que dificulta encontrar uma vaga por dois efeitos: busca mais limitada pela fragilidade maior das condições de vida e pela redução da atividade econômica que também leva a repensar a busca. Nesse sentido, a PNAD Covid, revelou que uma das principais causas da não procura por emprego foi a crise sanitária. Assim, a pandemia parece ser ‘a gota d’água num copo cheio’, um golpe duro num mercado de trabalho que já vinha ‘cambaleando’”, afirmam os especialistas da SEI.
Etkin ressalta ainda que o desalento potencializa um efeito de inércia sobre os desalentados: “quanto mais tempo sob a condição de desalentado, menores as chances de aquela pessoa voltar a reunir condições para se inserir novamente no mercado de trabalho no futuro”.
Comércio
O grupo de atividades de comércio e reparação de veículos automotores e motocicletas foi o setor que mais perdeu trabalhadores em números absolutos entre 2019 e 2020, com menos 170 mil pessoas ocupadas na área no período – uma queda de 15,1% na comparação entre os anos.
Para o presidente do Sistema Fecomércio-BA, Carlos de Souza Andrade, as demissões são fruto da recessão causada pela pandemia. Entretanto, ele explica que o auxílio emergencial e a possibilidade de reduzir a jornada do trabalhador foram fundamentais para evitar prejuízos ainda maiores.
Com o lockdown parcial vigorando no estado, o presidente da entidade pede a volta do auxílio emergencial e das medidas provisórias que permitam o corte de carga horária e salário.
Já o presidente do Sindicato dos Comerciários de Salvador, Renato Ezequiel, afirma que o comércio formal não teve peso nas demissões. Ele cita os dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que apontam que o setor de comércio criou 1.441 postos de trabalho com carteira assinada em 2020 na Bahia.
“No mercado formal, o que mais tivemos foram situações de suspensão do contrato de trabalho e redução da jornada no ano passado. Em Salvador, só tivemos a perda de apenas 333 postos de trabalho formais. Ano passado não foi um período de demissões assim”, afirma Ezequiel.
No último ano, os setores de serviços domésticos e alojamento e alimentação também registraram quedas expressivas em termos absolutos na Bahia, com redução de 106 mil trabalhadores e 105 mil pessoas ocupadas, respectivamente, ante 2019. O último dos dois grupos ainda registrou um recuo de 27,3%, o maior em termos percentuais no estado.
Dentre todos os grupamentos de atividade investigados pelo IBGE, apenas agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura teve aumento da sua população ocupada frente a 2019, com o registro de um saldo positivo de 1,5% ao passar de 911 mil para 925 mil pessoas empregadas.
Fonte – Correio da Bahia