Moraes x Musk: o que se sabe até agora

Ministro do STF autorizou depoimentos de representantes do X (antigo Twitter) no Brasil

 

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou na última terça-feira (16) os depoimentos de representantes do X (antigo Twitter) no Brasil.

A decisão foi dada em inquérito aberto para apurar as condutas de Elon Musk, dono da plataforma, e o suposto cometimento dos crimes de obstrução à Justiça, organização criminosa e incitação ao crime.

O pedido das oitivas foi feito pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em 9 de abril.

“Para que a PGR melhor possa avaliar a situação objeto do Inq 4.957/DF, impõe-se o deferimento das medidas pleiteadas, haja vista que estão em conformidade com a investigação determinada para os fins da instauração de Inquérito, que objetiva apurar as condutas de Elon Musk, dono e CEO da provedora da rede social ‘X’”, disse Moraes, na decisão.

O objetivo das oitivas solicitadas pela PGR é esclarecer condutas a Musk e se houve a reversão de algum bloqueio de conta na rede.

No documento, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, citou questionamentos que “entende pertinente” aos representantes da empresa no país:

  • se Elon Musk tem, conforme estatuto da empresa, atribuição para espontaneamente determinar a publicação de postagens na rede;
  • se Elon Musk fez alguma determinação sobre perfis vedados por ordem judicial brasileira;
  • se a empresa tirou o bloqueio de perfil até agora suspenso por determinação judicial (caso tenha feito isso, a PGR defendeu que a plataforma informe quem seria competente para essa tarefa na empresa).
  • se houve levantamento do bloqueio determinado por ordem judicial em vigor, que informem quais os perfis proscritos que voltaram a se tornar operantes.

X envia ao Congresso dos EUA decisões de Moraes 

O X (no Brasil) informou ao STF que a plataforma nos Estados Unidos enviou ao Congresso do país todas as decisões de Alexandre de Moraes e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) relacionadas à moderação e derrubada de conteúdo.

As informações foram enviadas no sábado (13) e constam no sistema do STF, no inquérito das milícias digitais.

Segundo o X Brasil, a ordem para envio das decisões partiu do Comitê de Assuntos Judiciários da Câmara dos Deputados dos EUA. A determinação foi cumprida ainda na sexta (12), de acordo com a empresa.

“Ressalte-se que a X Corp., ao cumprir o objeto do Ofício, registrou à autoridade norte-americana que os referidos documentos solicitados são confidenciais e se encontram resguardados por sigilo judicial”, disse o X Brasil a Moraes.

“Por esta razão, a X Corp. solicitou que a autoridade norte-americana mantenha e respeite a confidencialidade e o sigilo dos documentos produzidos.”

O X Brasil também afirmou que se “compromete a transmitir” ao ministro “quaisquer informações sobre o tema que venha a receber” da sede norte-americana do X, “em cumprimento ao seu dever de transparência e lealdade processual”.

Na manifestação que apresentou a Moraes, o X Brasil anexou a ordem do Comitê de Assuntos Judiciários da Câmara dos Estados Unidos.

O documento é assinado pelo congressista republicano Jim Jordan, atual presidente do comitê. O ofício, endereçado a Linda Yaccarino, CEO do X, é datado de 12 de abril.

Quem é Jim Jordan? 

Notório apoiador do ex-presidente Donald Trump, é como é descrito o deputado Jim Jordan.

Lobistas que atuam na capital norte-americana descreveram à CNN o deputado republicado Jim Jordan como um representante da extrema direita que atrelou sua imagem a Trump.

Recentemente, o deputado eleito por Ohio usou sua posição como chairman no comitê para atacar a rede de TV CBS por demitir uma repórter supostamente por ter um perfil conservador.

Em outubro de 2023, Jordan tentou chegar à Presidência da Câmara dos Deputados dos EUA com apoio público de Trump, mas não foi bem sucedido. Seu perfil radical tornou difícil encontrar consenso.

Como presidente da Comissão de Justiça da Câmara, Jordan atuou na abertura das investigações para um eventual processo de impeachment contra o presidente Joe Biden.

Jordan construiu seu perfil como um defensor inflexível do Partido Republicano, entrando em conflito tanto com republicanos como com democratas.

O deputado incentivou paralisações governamentais em 2013 e 2018 e foi uma peça importante nas tentativas de Trump de derrubar a vitória do democrata Joe Biden nas eleições de 2020, de acordo com uma investigação do Congresso.

Ele também atuou para proteger Trump de intimações para depor sobre seu envolvimento na invasão do Congresso em janeiro de 2021.

Veículos estrangeiros destacam embate

Duas publicações internacionais renomadas deram destaque, no último fim de semana, ao embate entre Musk e Moraes.

Segundo reportagem do britânico “The Economist”, a disputa entre Musk e Moraes apresenta duas questões:

O poder da Suprema Corte, “que goza de autoridade descomunal sobre a vida dos brasileiros”
O debate da regulamentação das redes sociais sem ferir a liberdade de expressão, no qual o Brasil é um importante campo de batalha.

A publicação cita um estudo da GWI, empresa de pesquisa de mercado de Londres, em que é mostrado a dependência dos brasileiros nas redes sociais, o que torna o país “um terreno fértil” para a disseminação de desinformações e colabora nos esforços para regulamentar a questão.

A partir disso, é questionado se o STF é “o tribunal mais poderoso do mundo”, já que tem a responsabilidade hoje de fazer a regulamentação das mídias sociais.

Já o artigo assinado pela colunista Maria Anastasia O’Grady no “The Wall Street Journal”, dos Estados Unidos, cita que Moraes incluir Musk no inquérito das Fake News “não tem nada a ver com conter o domínio das grandes tecnologias ou reduzir os riscos para a democracia ou mesmo proteger as crianças das redes sociais”.

Esta seria uma luta do STF “politizado” e os críticos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

“Isso mostra que o Brasil não tem mais um Judiciário independente. A triste realidade é que a sua democracia está a morrer em plena luz do dia”, expressa O’Grady.

Para a colunista, a Suprema Corte “quer calar a boca dos formadores de opinião cujas políticas não concorda, mas que alcançam milhões de pessoas através de plataformas como o Twitter”.

E, que muitos brasileiros, assim como Musk “acham isso antidemocrático”.

“Eles temem que um tribunal com tanto poder arbitrário seja um perigo muito maior para a liberdade brasileira do que qualquer voz independente, mesmo aquelas que estão à margem”, diz O’Grady.

O começo

Em 3 de abril, o assunto voltou à tona quando o jornalista norte-americano Michael Shellenberger postou críticas a Moraes no que está sendo chamado de “Twitter Files Brazil”, composto por prints de e-mails que seriam de um ex-executivo do Twitter, em que ele teria criticado pedidos de acesso a dados de usuários da plataforma pelo Judiciário brasileiro, contrariando a política da própria rede.

O jornalista acusa o ministro de exigir que o Twitter revelasse detalhes pessoais sobre usuários que subiram hashtags que ele “não gostou”; censurar, unilateralmente, postagens de parlamentares brasileiros; e tentar transformar as políticas de moderação de conteúdo da rede social em uma arma contra apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Esses pedidos não são inéditos e envolvem investigações de ataques a ministros do STF, além de solicitações para conter a propagação de notícias falsas.

Em 6 de abril, Musk questionou Moraes sobre “tanta censura no Brasil” e informou que derrubou os bloqueios das contas na plataforma que haviam sido impostas pelo magistrado.

Musk respondeu uma postagem de Moraes do dia 11 de janeiro com a pergunta: “Por que você está exigindo tanta censura no Brasil?”.

Na publicação em que foi feita o questionamento, Moraes elogiava a nomeação de Ricardo Lewandowski ao cargo de ministro da Justiça.

CNN Brasil

 

Marcelo Camargo/Agência Brasil e REUTERS/Gonzalo Fuentes