quinta-feira, 13 nov 2025

Nova lei obriga condomínios a denunciarem casos de agressão

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A rede na defesa dos mais vulneráveis na Bahia ganhou mais um importante aliado em agosto – pequeno que seja. É que a Assembleia Legislativa do estado promulgou lei que obriga condomínios residenciais a denunciar casos de agressão doméstica e familiar contra mulheres, crianças, idosos e adolescentes.

A autoria do projeto é da deputada Ivana Bastos (PSD), que esta semana apresentou outra proposta de combate à violência, permitindo também a supermercados e farmácias, chamados de “espaços seguros”, receber e encaminhar aos órgãos competentes denúncias de violência contra esse mesmo público.

De acordo com informações do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a lei federal Maria da Penha define como cinco os tipos de violência doméstica e familiar: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Ainda de acordo com o ministério, esse tipo de crime é a principal causa de feminicídio no Brasil e no mundo.

Segundo dados da Central de Atendimento à Mulher, o Disque 180, houve aumento de quase 54% no número de denúncias na Bahia entre março até 19 de abril de 2020: foram 95 denúncias de violência doméstica no estado em março e 146 em abril. A ligação é gratuita e confidencial e funciona 24 horas por dia.

Estatísticas no portal da Secretaria da Segurança Pública da Bahia na internet contabilizam, somente este ano, de janeiro a junho, a marca de 1.258 estupros. Em todo o ano passado foram 3.005 ocorrências. A página não discrimina outros crimes contra mulheres, crianças ou idosos, nem mesmo o número de feminicídios.

Para Ivana Bastos, o avanço protetivo conquistado com lei é em defesa de um bem maior, o de “quebrar marcos exorbitantes da violência a mulheres, idosos, crianças e adolescentes no estado”. Segundo ela, é importante observar que, com o aumento da criminalidade, a própria legislação penal procura dar proteção às vítimas e testemunhas.

Crianças e idosos

“Entendemos que esse é um papel não só da vítima, mas também do Estado, do poder público, e de qualquer pessoa que presencie as agressões. Lembrando que, muitas vezes, a vítima tem medo do seu agressor ou mesmo pode não ter acesso a um canal de denúncia. Crianças e idosos, por exemplo, são vítimas que normalmente não sabem ou não encontram um meio de denunciar”, disse.

“Instrumentos normativos vão sendo criados com esta finalidade com o objetivo de proteger a vítima e acabar a impunidade, estabelecendo normas para a organização e a manutenção de programas de proteção à vítima e às testemunhas ameaçadas, como a nossa lei que inclui os condomínios nessa rede em defesa da vida e da civilização”.

Presidente do Sindicato da Habitação na Bahia (Secovi), Kelsor Fernandes vê com preocupação a medida. Apesar de entender a importância de qualquer dispositivo de proteção, ele considera “temerário transferir uma responsabilidade que seria da própria vítima para um síndico, vizinho ou administrador de condomínio”.

Ele concorda que, salvo situação flagrante ou que o caso ocorra em áreas comuns, aos olhos de outras pessoas, funcionários e câmeras, “quem quer que seja tem o dever de denunciar”. “Mas quando a violência ocorre dentro da unidade autônoma, já fica um pouco mais complicado, porque e se a vítima, por exemplo, não quiser prosseguir com a queixa?”, indaga.

O texto prevê que os condomínios deverão fixar cartazes, placas ou comunicados sobre a lei nas áreas de uso comum. Em caso de descumprimento da medida, o condomínio poderá, em um primeiro momento, ser advertido. A partir daí, a multa aplicada ao condomínio infrator poderá variar de R$ 500 a R$ 10 mil.

Tudo vai depender das circunstâncias da agressão. Ainda segundo o documento, os valores serão atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e revertidos para fundos e programas de proteção aos direitos das mulheres, crianças, adolescentes ou idosos.

Fernandes fala que o setor “tentou negociar [com os parlamentares], mas a proposta já estava aprovada, ficamos de mãos atadas”. “É complicado demais, a lei é infeliz nesse aspecto da responsabilização [da denúncia], pois obriga que o condomínio revele dados pessoais do agressor, como até o CPF, e ele vai saber que foi o síndico”. “Ou seja, a pessoa será um dedo-duro forçado, sob pena de omissão, caso não denuncie. Só que já estamos tratando de alguém violento, um agressor, o que também causa insegurança a quem denuncia. O que a gente espera é que a lei possa ser modificada, ou aprimorada, pois do jeito que está é muito complicado. A gente até questiona se a Assembleia é a casa certa para legislar esse tipo de lei”.

A reportagem de A TARDE procurou a Polícia Civil com o objetivo de falar com uma fonte na Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) – por entender que elas são a principal vítima desse tipo de violência –, ou outra autoridade, mas até o fechamento desta edição a assessoria de imprensa não havia conseguido um representante.

Administrador de nada menos que 12 condomínios residenciais, o síndico profissional João Xavier diz que há um projeto de lei federal que vai de encontro ao da Bahia e outros estados que já promulgaram lei do tipo. Segundo ele, a proposta é salutar, “pois hoje já existe uma pressão [da sociedade] para que se faça a denúncia, mas não há nada que resguarde o condomínio”.

“Já foi muito comum se chamar a polícia e, depois, lá no apartamento, informarem que não havia problema nenhum. No dia seguinte se tirava denúncia. Ou seja, colocando a pessoa que denunciou em risco. Então a lei vem para regrar e dar obrigatoriedade para que o síndico faça a denúncia, mas também resguardar ele caso algo do tipo aconteça”.

“É uma boa lei, importante, que só precisa adequar o viés e a redação, para deixar bem claro que o síndico não tem responsabilidade sobre a denúncia, apesar de ter de fazê-la, e para não deixar margem de ser enquadrada falsa comunicação”, diz.

A Tarde

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JN

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